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sábado, 5 de maio de 2018

DITÚRBIOS PSICOMOTORES COMO SINTOMA DE TRANSTORNOS EMOCIONAIS




       As pesquisas da Psicanálise trouxeram a importância do fator emocional no desenvolvimento infantil e sua influencia no processo de aprendizagem; daí a pergunta que se faz necessária e merecedora de um estudo mais aprofundado: os distúrbios psicomotores não seriam sintomas de transtornos emocionais? A reeducação Psicomotora com instrumentos e técnicas seria capaz de retirar os sintomas de forma definitiva? Ou eles poderiam reaparecer com outra sintomatologia, ou ainda reforçados mais ainda, talvez até tornando-se crônicos? e quando essas crianças ficarem adultas e simplesmente passar pelo mesmo problemas após um fim de relacionamento e ficar procurando diferentes formas de "como fazer ele me procurar?"

      Le Boulch (1982) dá uma noção do perfil de uma criança com transtornos psicomotores ao afirmar que elas têm uma situação social medíocre, uma imaturidade afetiva que, às vezes, é a causa principal dos transtornos instrumentais, sendo estes apenas sintomas. Em relação à educação psicomotora, o educador afirma que se a personalidade da criança não estiver muito perturbada, a intervenção da técnica a nível instrumental dá resultados satisfatórios. O mais frequente é o sintoma ser expressão de uma perturbação mais profunda da personalidade e se o educador interessar-se apenas pela técnica, sem preocupar-se com a pessoa de forma global, muitas serão as conseqüências.
      Olhar a terapia psicomotora sob o viés psicanalítico seria ver os transtornos como significantes, ou seja, a representação simbólica de sua estrutura. Julian de Ajuriaguerra (apud LEVIN, 1995) muito bem define o outro ângulo da Terapia Psicomotora quando diz que não basta influir na posição, na habilidade e rapidez, na qualidade do movimento, mas principalmente na organização do sistema corporal modificando o corpo em seu conjunto, na maneira de sentir, de perceber e apreender as influências emocionais.
       A respeito do corpo Pierre Vayer descreve que: “[...] todas as experiências da criança (prazer, dor, sucesso, fracasso) são sempre vividas corporalmente [...]” (1984, p.30).O corpo precisa ser diferenciado do sujeito, ele tem que conquistar este corpo através de um trabalho árduo de descobertas e conquistas. O corpo é construído e constituído, simbolicamente, a partir de uma história com representações, nome, lugar, posição, que começa a se desenvolver independente da criança, já a partir do desejo de sua mãe em ter um filho. Está em sua origem e é este desejo que a humanifica.
      O sintoma, para a Psicanálise, se caracteriza por uma solução de compromisso que substitui um desejo que não pode ser realizado, causa um alívio, uma descarga afetiva contra uma angústia insuportável (FREUD, 1968). Deve-se pensar qual a representação que tem este sintoma para esta criança e sua família e qual o motivo inconsciente para a escolha deste sintoma.
       O tipo de sintoma escolhido pela criança, de forma inconsciente, se expressa no corpo, aparece, fica exposto a ser visto, tais como: desequilíbrio, tensão corporal, falta de coordenação, limitação de movimentos impedindo a criança de se expressar e se desenvolver. Há um obstáculo na construção deste corpo. O esquema corporal, o tônus muscular, a imagem do corpo se encontram perturbados ocasionando ao mesmo tempo confusões espaciais, de equilíbrio, de coordenação e de movimento (LEVIN, 1995).
       Outro fato a se observar é que este tipo de transtorno, diferente dos outros, ao estar no corpo, se torna visível, exposto ao olhar de todos, inclusive dos pais, tornando-se presença constante, preocupando os outros e a ela mesma. Simultaneamente, torna esta criança diferente das outras. Na escola, não é capaz de participar das brincadeiras corporais por não saber; encontra-se sempre relegada a um segundo plano, sendo também motivo de crítica dos colegas por não movimentar corretamente o corpo.
       Este diferencial da criança faz dela um dependente do adulto, geralmente a mãe que a controla e protege excessivamente desde a mais tenra idade, executando por ela as ações mais simples. Essa forma de a criança chamar a atenção dos pais relaciona-se com falhas na função materna e paterna. Não houve o processo de diferenciação, individuação, separação. O seu corpo continua sendo uma extensão do corpo de sua mãe como quando era bebê. Não teve a lei da interdição paterna, ficou presa ao outro; não tem a imagem una de seu corpo, mas de um corpo ligado à mãe e que dela necessita para ser olhado e cuidado.
       De forma inconsciente, pois o sintoma é inconsciente, ela separa-se, estabelece um corte aparente, falsa separação: o distúrbio psicomotor, uma defesa contra a angústia de separação. Mas continua a depender dos cuidados da mãe, ser olhado e visto por ela, mesmo sob pena de não ter sua imagem corporal, seu espaço, sua identidade e subjetividade. Segue sendo objeto do desejo de sua mãe deixando de caminhar em seu desenvolvimento e como sujeito de seu desejo (LEVIN, 1995).
       É o desejo que está oculto atrás do sintoma psicomotor e presente na estrutura do movimento que leva o sujeito ao gozo auto-erótico, impossibilitando seu crescimento, seu desenvolvimento manifestado sob a forma de instabilidade, debilidade ou inibição psicomotora. A queixa do transtorno não é da criança e sim do outro. Seu lugar é ser instável, sua instabilidade nem sempre é um problema, mas uma defesa. A criança portadora de um sintoma psicomotor não passou do Princípio do Prazer ao Princípio da Realidade.
       Duas diferenças chamam a atenção entre estes dois tipos de transtorno psicomotor. Na instabilidade a criança tenta agressivamente conquistar seu espaço, mesmo que seja de aparência, fazendo-se diferente em relação ao outro. Já o inibido tem movimentos limitados ou nulos, não está motivado a explorar o mundo, a se relacionar com outros, fica temeroso, inseguro, não consegue se separar. É sempre o “bonzinho” que não quer desagradar os pais para não ser desaprovado e não perder seu lugar de objeto, um lugar que ele conhece e não gera angústia.
       A outra diferença diz respeito ao olhar do outro. Enquanto na instabilidade, a criança tem o olhar do outro o tempo todo, controlando, atuando, na inibição ocorre o contrário uma vez que o olhar se faz presente de forma indireta. A impressão é que a criança carrega este olhar com ela na forma de cuidado e também de dependência. Ela não precisa do controle deste olhar, pois o controle já faz parte dela.
       A proposta de Levin (1995) para uma intervenção é uma clínica psicomotora baseada na transferência, onde o brincar espontâneo tem sua singularidade, uma transferência particular que se instala entre o terapeuta e a criança. Ela transfere para o psicomotricista um brincar que possui uma linguagem significante.
      Para ele, lugares imaginários são determinados nesta transferência de imagens: o lugar em que a criança se coloca e o lugar que ela dá ao terapeuta vão sendo delineados na “fala” da criança. Neste posto de “sujeito suposto saber” em que foi situado, o terapeuta deve olhar, ler e decodificar esta linguagem.
      Torna-se uma situação inédita: ao mesmo tempo real e fictícia, em que paciente e pais supõem que o analista sabe, ele tem o poder de curar, solucionar a doença. É uma relação única em que não há reciprocidade nem simetria, somente a busca da verdade, a verdade do paciente. Toda “fala”, ação, dizer do terapeuta é deste lugar que lhe foi dado pela criança, levando em conta a transferência provocada.
       Quando há uma recomendação do terapeuta ou da clínica, uma transferência prévia já é observada e se faz presente nas primeiras entrevistas, cujo objetivo é explorar os conteúdos obtidos da criança e dos pais. Depois de certo tempo, outro tipo de transferência se faz sentir e se instala, dando início verdadeiramente ao vínculo necessário aos trabalhos.  Constrói-se lentamente, deixando de existir o “sujeito suposto saber” para surgir o outro neste lugar de confiança da criança na capacidade de ouvir, ver, ler o que for produzido nas brincadeiras, nos seus dizeres e ações (LEVIN, 1995).
       A clínica psicomotora de Levin (1995) fala de uma leitura possível, uma interpretação, uma análise do brincar corporal da criança na situação transferencial, pontuando, intervindo, situando simbolicamente este dizer. Caso o terapeuta não o faça, o dizer fica como não dito, perde o valor e lugar e a linguagem deste corpo continua apenas como imagem enganosa. O fundo perturbado ao qual se referia Ajuriaguerra (1983) não é elaborado pela criança e desta forma, mais cedo ou mais tarde, o sintoma retorna igual, de outra forma ou em outro lugar, mas sempre um sinal de que algo existe por trás deste “dizer”.
       Repensar a importância da Psicomotricidade e o trabalho da reeducação psicomotora é tarefa relevante para pais, professores, pedagogos, psicopedagogos e aqueles que de uma forma ou de outra lidam com a criança nesta fase.


Vídeo criado por Neuro Saber

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